domingo, 18 de dezembro de 2011


Sérgio Britto em “A última gravação de Krapp” - de Beckett


Eu quando podia assistia ao programa de Sérgio Britto. Nunca o vi atuando no teatro, infelizmente, mas sempre o achei, e acho, um cara grandioso. Vai abaixo um trecho de uma entrevista para o Sesc SP em 2003.





Vamos falar um pouco sobre esse espetáculo em cartaz, o Sérgio 80. O que você conta nele?


Eu cito Quatro Vezes Beckett porque eu conto minha experiência com o Gerald Thomas, fui eu que o trouxe para o Brasil. Eu falo dos dois Geralds: do desagradável, aquele com o qual eu não concordo, aquele que chega, olha para a platéia e diz: Ih, tudo com cara de burro, não vão entender nada hoje, vai ser ruim; e o Gerald que trabalha com os atores. Não há um ator que tenha trabalhado com ele que não o ache ótimo. Ele desperta coisas em você que você não sabia que podia fazer. Ele é maravilhoso, é um diretor criativo como poucos. Conto que fui um rapaz muito tímido e, ao mesmo tempo, muito adulto. Eu não brincava muito, eu ficava perto dos mais velhos ouvindo as conversas. A família me fez aquela subliminar: Meu filho vai ser médico, meu filho vai ser médico. Pois bem, fui ser médico. No quarto ano de medicina me perguntaram: Quer fazer teatro? E respondi: Quero! Foi impressionante porque eu não vacilei. Depois eu fiquei espantado por que como assim eu disse quero? De onde veio isso? Eu comecei a fazer teatro universitário, depois fiz o Teatro de Estudantes, do Paschoal Carlos Magno. Aí já era a época do Sérgio Cardoso, que foi me empurrando para o teatro. Acho que ele foi uma das coisas mais determinantes para eu largar a medicina. Nós brincávamos de fazer teatro, era uma coisa mais ou menos. Mas o Sérgio já era ator.

Que texto você viu nesse tempo todo que considera pilar da dramaturgia brasileira que vai sustentar ainda futuras gerações?


Tem um autor que eu não sei quanto tempo vai durar, mas que é sensacional, que é Nelson Rodrigues. Eu me lembro que quando garoto ia muito ao cinema também, e gostava mais, na verdade - de certa forma eu ainda acho que gosto mais de cinema que de teatro como espectador. O cinema me envolve mais, me faz fugir mais da realidade, não sei... Eu gosto de teatro, muito, mas sou muito exigente. Mas eu sou muito exigente comigo mesmo também. Demais. A ponto do exagero. Mas em 1943 eu vi Vestido de Noiva, foi quando tudo mudou, eu comecei a gostar e querer ir mais ao teatro. Aí já não ia mais com a família, ia por conta própria, já tinha 20 anos. Foi uma revelação das possibilidades do teatro, aquele cenário do Santa Rosa, outros planos, a realidade, a fantasia, alucinação.

Além de Vestido de Noiva, há algum outro texto?

Outro texto muito importante é O Cristo Proclamado, de Francisco Pereira da Silva. Recentemente Giani Ratto fez anos e nós tivemos um almoço com ele no Albamar, no Rio de Janeiro. Fernanda, Fernando, Ítalo Rossi, Calma Murtinho e Tânia Brandão, que escreveu um livro sobre Teatro dos Sete. Ao mesmo tempo, a filha dele fez um documentário sobre nós comentando Giani Ratto. Todas as nossas conversas vão virar um documentário. Falamos muito sobre essa experiência de O Cristo Proclamado. É uma peça que hoje faria um sucesso tremendo.

Como você avalia a qualidade do teatro hoje?


Giani Ratto diz que nós continuamos perdidos. Talvez o desânimo dele seja maior que o meu, mas nós estamos realmente numa situação bem confusa culturalmente. Em São Paulo geralmente se fala que está tudo bem. Eu não acho que está. Eu vejo a programação de São Paulo e realmente está bem melhor que o Rio, que no momento não atravessa uma situação boa. Há muitas estréias por aqui, mas estréias insignificantes, que não representam nada.

O que você chama de confusão?


As pessoas não estão com caminhos firmes e nítidos. Elas não sabem o que fazer do teatro, e saem por aí, como dizemos no meio, dando tiro na praça. Peças que não se sabe nem por que foram montadas. Montou-se porque o papel era bom para determinado ator ou determinada atriz. Isso não é teatro, isso é uma exploração comercial do entretenimento levada às últimas conseqüências. O teatro não sobrevive culturalmente assim. Não estou aqui sendo um moralista do teatro dizendo que não pode haver o puro entretenimento. Pode, sem problemas, mas só?






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