domingo, 22 de março de 2009

Um Poeta (dito) Maldito: António Botto

"António Botto é o Deus da poesia moderna"
Federico Garcia Lorca

A biografia de Botto está adornada pelo escândalo e controvérsia e o elogio de contemporâneos como António Machado, Miguel de Unamuno, Camilo Pessanha, Virginia Wolf, Teixeira de Pascoais, Luigi Pirandello, Stephan Zweig e Rudyard Kipling, que o consideram um dos poetas mais brilhantes do seu tempo. James Joyce chamou-lhe " o poeta do amor e da paixão". Porém, e apesar da sua genialidade, este poeta, dramaturgo e contista do século XX, tem sido , injustamente, pouco recordado na literatura de expressão portuguesa e universal.

" O mais importante na vida é ser-se criador - criar beleza" (A.B)

Á Memória de Fernando Pessoa (A.B)

Se eu pudesse fazer com que viesses
Todos os dias, como antigamente,
Falar-me nessa lúcida visão
- Estranha, sensualíssima, mordente;
Se eu pudesse contar-te e tu me ouvisses,
Meu pobre e grande e genial artista,
O que tem sido a vida - esta boemia
Coberta de farrapos e de estrelas
Tristíssima, pedante, e contrafeita,
Desde que estes meus olhos numa névoa
De lágrimas te viram num caixão;
Se eu pudesse, Fernando, e tu me ouvisses,
Voltávamos à mesma:
Tu, lá onde
Os astros e as divinas madrugadas
Noivam na luz eterna de um sorriso;
E eu, por aqui, vadio da descrença
Tirando o meu chapéu aos homens de juízo. . .
Isto por cá vai indo como dantes;
O mesmo arremelgado idiotismo
Nuns senhores que tu já conhecias
- Autênticos patifes bem falantes. . .
E a mesma intriga; as horas, os minutos,
As noites sempre iguais, os mesmos dias,
Tudo igual! Acordando e adormecendo
Na mesma cor, do mesmo lado, sempre
O mesmo ar e em tudo a mesma posição
De condenados, hirtos, a viver
- Sem estímulo, sem fé, sem convicção...

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